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A crise financeira/económica e social actual, influencia a forma e severidade do adoecer mental?

A decorrência humana (trans-histórica), mostra-nos que a capacidade de enfermar existe para além das “crises” situacionais. As crises representam uma ameaça, por isso são ansiógenas e, nesse ansiar, desorganizam o comportamento e impõem o accionamento de reservas adaptativas (que uns terão mais do que outros). Dentro ou fora das crises, é desejável um bom acesso às nossas partes boas, um exercício pleno (jogo), um vai-e-vem dos diferentes papéis psicológicos (e sociais) de que somos constituídos, e a capacidade de nos ancorarmos bem nas nossas acontecências histórico-vitais. A crise, e os novos modelos de gestão trazidos para o sistema, carrearam agentes investidos maniacamente de poder (oco e sem relação com os modos de fazer existentes) que se encarregaram de produzir colaboradores (“yes-coisas”) deprimidos, ameaçados e organizados (formatados) melancolicamente.

Neste quadro, clivado e não permitindo lugar para o encontro (nem para a confirmação entre pares), resta fazer de morto, não já e apenas numa similitude etológica, mas numa posição bem mais humana de desistência, de desinvestimento e de anestesia, o que nos preocupa a nós (clínicos) e que deveria também preocupar as empresas e os políticos (fazedores das tais políticas sociais e de protecção à família). Infelizmente, não me parece ser este o caso.